Mudanças climáticas alteram rotina do Porto Sudeste, no Rio de Janeiro
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Porto Sudeste adota ações para reduzir emissões de escopo 1 e 2

Alterações no regime de ventos, imprevistos que impedem a entrega de cargas e maior preocupação com saúde dos trabalhadores no ambiente industrial do porto são alguns dos efeitos já sentidos.

“É importante dizer que esses riscos e impactos climáticos não são algo que vai acontecer em vinte ou trinta anos, estamos vivendo neste exato momento”, diz o diretor de relações institucionais e sustentabilidade do Porto Sudeste, Ulisses Oliveira.

O principal produto movimentado no Porto Sudeste é o minério de ferro, que tem alta emissão de particulados no ar. Com a maior incidência de ventos, o terminal portuário precisou investir em novos polímeros, à base de celulose, para reduzir a dispersão desses poluentes.

Outra questão é o aumento do nível do mar, previsto para alcançar uma elevação de 0,66 metro até 2050, e o porto precisará adotar medidas de mitigação para lidar com o novo cenário, pois o pátio onde está localizada a área operacional pode ter alagamentos. O píer não deve sofrer grandes impactos, segundo o diretor.

As tempestades são mais um exemplo dos impactos dos extremos climáticos sobre a atividade portuária. No início do ano passado, as fortes chuvas que assolaram o estado de Minas Gerais interromperam o ramal ferroviário que leva as cargas até a Baía de Sepetiba.

“Houve uma interrupção por um curto período de tempo e depois uma utilização de uma única perna do ramal, o que fez com que a distribuição de Minas para o Rio fosse muito mais demorada do que o regular”, lembra Oliveira.

A situação levou navios a ficarem atracados por mais tempo do que o previsto, aguardando o carregamento, e com isso, as emissões de carbono do terminal subiram, relata o executivo.

Avaliação de risco

O Porto Sudeste monitora as emissões de gases de efeito estufa desde 2015. No ano passado, a companhia concluiu um mapeamento de impactos e riscos climáticos, motivado pela preocupação com a continuidade do negócio e com o entorno do porto, segundo Oliveira.

Os resultados foram incorporados à matriz de riscos do empreendimento.

“O terminal portuário que está em áreas sujeitas a maiores incidências de vento, mudança de maré, aumento do nível do mar, tem que estar preocupado com isso se quiser continuar a viver”, afirma.

Entre as ações adotadas para redução de emissões dos escopos 1 e 2, referentes às atividades operacionais e ao consumo de energia, o Porto Sudeste passou a investir este ano em certificados de compra de energia renovável, os I-Recs.

“Uma usina de geração está muito fora do nosso negócio e não temos muito espaço para isso”, explica Oliveira sobre a decisão pela compra de energia de uma empresa ainda não divulgada, no lugar de gerar a própria energia renovável.

Além disso, a companhia baniu o uso de gases refrigerantes em equipamentos e substituiu todos os aparelhos de carregamento de navios, descarga e viradores de vagão, empilhamento e retomada de minério de ferro a diesel por elétricos. Também foram adotadas iniciativas de reúso de água e tratamento de efluentes.

Setor portuário demanda ações transversais

Uma das medidas tomadas pelo Porto Sudeste após a conclusão dos estudos de impactos e riscos climáticos foi compartilhar os resultados com o município de Itaguaí, onde está localizado, para auxiliar na tomada de decisões sobre medidas a serem tomadas.

“Um possível aumento do nível do mar pode em um horizonte de 30 anos impactar eventualmente nossa atividade, mas antes disso vão ocorrer impactos em regiões do nosso entorno. Precisamos fornecer essas informações valiosas para o município, que é quem é capaz de fazer as políticas públicas e investimentos necessários”, aponta Oliveira.

Como os efeitos das mudanças climáticas sobre os portos vão além da área de atuação dos operadores, as ações de mitigação dependem de uma maior integração entre as análises de riscos climáticas mapeadas pelas diferentes entidades e níveis de governo.

“O que está faltando é ter uma peça de planejamento que integre análises feitas pelos ministérios e agências, para olhar de forma integrada todas essas questões”, diz a gerente de planejamento urbano da consultoria dinamarquesa Ramboll, Alejandra Devecchi.

A consultoria elaborou uma metodologia para a logística portuária que leva em conta a capacidade de cada região do país e ações de adaptação às mudanças climáticas.

Devecchi aponta que deslizamentos e inundações são alguns dos riscos às atividades portuárias, porque geram impactos sobre rodovias e ferrovias e impedem que os portos recebam e distribuam mercadorias.

“Os portos dependem intimamente de acessos terrestres, além dos acessos aquaviários. Existe toda uma questão logística ligada aos acessos terrestres, tanto rodoviários, como ferroviários”, afirma Devecchi.

A executiva cita o exemplo que ocorreu em fevereiro deste ano, quando a BR-101 teve a circulação interrompida devido às fortes chuvas no litoral de São Paulo, região onde está localizado o terminal de maior movimentação do país, o Porto de Santos.

Um estudo da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) publicado em 2021 mostrou que o Porto de Santos é um dos três terminais com maior risco de paralisação no Brasil por causa de ameaças causadas por chuvas fortes, inundações e outras intempéries climáticas.

Descarbonização do setor marítimo

Para o diretor do Porto Sudeste, as iniciativas adotadas pelos terminais portuários vão ser fundamentais na transição para uma economia de baixo carbono. Além da redução das próprias emissões, os empreendimentos podem ajudar na descarbonização do frete marítimo global.

“O setor portuário tem uma contribuição enorme a dar, em especial no escopo 3. Se os navios que atracam no Brasil puderem, de alguma maneira, reduzir suas emissões, isso vai fazer uma diferença brutal na nossa cadeia de emissões em geral”, diz.

Uma possibilidade é fechar contratos no mercado livre de energia que permitam ao porto fornecer essa energia. Segundo o diretor, o uso de energia elétrica pode inclusive sair mais barato para os navios do que o uso do motor à combustão.

Entretanto, uma barreira para a implantação de projetos desse tipo é a falta de padrões nas conexões elétricas dos navios.

´Temos incentivado a Antaq a nos ajudar a ter esses padrões definidos pela IMO [Organização Marítima Internacional], numa definição intencional, para que os armadores tenham isso estabelecido. Cada momento sem esse padrão, dificulta as ações do futuro. Há navios sendo produzidos agora que vão ter uma vida útil de até 25 anos e que não têm um padrão específico”, aponta Oliveira.